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​Conversa, quarta feira, 13 de março 2013

Um novo modo da Igreja ser

Nesses dias, a Igreja Católica vive dias muito importantes de sua caminhada histórica. Quem lê isso certamente pensará que estou falando da eleição papal no Vaticano. Essa é importante para a Igreja de Roma que recebe um novo bispo e com esse bispo vai exercer, não somente o papa eleito, mas toda a diocese de Roma, a função de velar pela unidade das Igrejas locais no mundo. Então, a eleição papal tem sim uma importância para todas as Igrejas históricas, espalhadas pelo mundo. No entanto, a Igreja é realmente católica, isso é, universal, somente à medida que assume verdadeiramente o rosto e a cor do povo de Deus em cada local, em cada região do mundo. Há 50 anos, o Concílio Vaticano II retomou esse ensinamento da Igreja antiga: falar em Igreja local é pleonasmo. É como falar em roda redonda. A Igreja é por natureza comunidade local em comunhão com todas as outras comunidades de fé no mundo inteiro. Embora não tenha conseguido colocar em prática esse ensinamento do Cristianismo primitivo, o Concílio Vaticano II nos transmitiu esse espírito. Também em 1999, em um documento preparatório ao seu sínodo em Roma, a Federação dos Bispos católicos da Ásia declarou: “A compreensão que a Igreja tem de si mesma deve ser a de uma Igreja verdadeiramente local, inserida em uma realidade particular. Ela é católica (universal) à medida que se torna cada vez mais autóctone e inculturada O corpo do Cristo se torna real em um povo concreto, no tempo e no espaço”[1].

  Por isso, o conclave que nesses dias ocorre no Vaticano pode ser importante, mas quero chamar atenção para o que nesse final de semana (de 08 a 10 de março) ocorreu no interior do Nordeste. Juazeiro (da Bahia) é uma diocese que, durante muitos anos, procurou sempre ser fiel ao espírito do Concílio. Como Igreja, prestou um serviço inestimável ao povo mais empobrecido do sertão nordestino. Nesses dias, as forças vivas da diocese de Juazeiro se reuniram com o bispo e o clero para refletir sobre o lugar das comunidades eclesiais de base na Igreja local e como apoiar as cebs mais urbanas e que têm mais dificuldade de encontrar o seu estilo próprio nas cidades. 

Os meios de comunicação que adoram espetáculos não tiveram tempo nem interesse em mostrar uma Igreja viva reunida que se pergunta sobre o que “o Espírito diz hoje às Igrejas” (Ap. 2, 7) e que contribuição essa Igreja pode dar ao nosso país e continente nesse momento histórico do mundo e no processo de mudanças sociais e políticas que ocorrem na América Latina. Entretanto, de alguma forma, cada vez mais no mundo, a credibilidade das Igrejas e de toda religião está ligada ao compromisso dessas contribuírem com a justiça e a paz no mundo. No nosso continente, foi a conferência dos bispos em Medellín (1968) que deu à Igreja Católica o rosto próprio de uma Igreja latino-americana e caribenha. Pela primeira vez, uma grande assembleia eclesial se interessava por um tema que não era só interno à vida da Igreja: “A Igreja no mundo em transformação”. A perspectiva era projetar uma visão integral do ser humano, compreendido a partir de sua dimensão social e da sua vocação para a libertação. O milagre divino é que, apesar de todas as dificuldades da Igreja e do mundo, Medellín deixou um espírito que não morreu. E hoje, esse mesmo espírito grita às comunidades eclesiais de base e às pastorais sociais comprometidas com os mais empobrecidos que o processo de transformações sociais e políticas hoje emergente em vários países da América Latina precisa da contribuição própria e espiritual dos cristãos de base. Embora restrito a essas minorias proféticas, o apelo dos bispos naquela conferência ressoa até hoje: “Que se apresente cada vez mais nítido, o rosto de uma Igreja autenticamente pobre, missionária e pascal, desligada de todo o poder temporal e corajosamente comprometida na libertação do ser humano por inteiro e de toda a humanidade” (Medellin. 5, 15 a).

[1] - Cf. FEDERAÇÃO DAS CONFERÊNCIAS EPISCOPAIS DA ÁSIA, O que o Espírito diz às Igrejas, Documento de Síntese, n. 1, feito para o Sínodo sobre a Ásia, publicado pela FABC em 1999. Tradução brasileira in SEDOC 281/ julho-agosto de 2000, p. 39.

Marcelo Barros

Camaragibe, Pernambuco, Brazil

Sou monge beneditino, chamado a trabalhar pela unidade das Igrejas e das tradições religiosas. Adoro os movimentos populares e especialmente o MST. Gosto de escrever e de me comunicar.

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