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Deus no tribunal do mundo

Deus no tribunal do mundo

                   Mesmo quem não é advogado, não pode ficar indiferente ao ver alguém a quem se ama ser tão mal falado. Em tempos de fake-news, as pessoas cujo nome é envolvido em notícias falsas correm para desmascarar a mentira. No entanto, há um nome usado desonestamente e não há como impedir. Muito antes de existir internet e guerras de quarta geração nas quais as armas são os meios de comunicação, já o nome de Deus era usado para legitimar ditaduras, justificar colonialismos, provocar violências, guerras e massacres. Na América Latina, ditadores militares tomaram o poder a serviço do império norte-americano e, para garantir os privilégios da elite econômica, usavam o nome de Deus. Nas eleições presidenciais que o Brasil viveu em 2018, a maioria das pessoas religiosas optou não apenas por um caminho conservador e indiferente à causa dos mais pobres. Mais do que isso: votou na extrema-direita, enquanto a maioria dos ateus e das pessoas sem religião votou na democracia. E explicitamente em nome de Deus, grupos evangélicos e pentecostais, com seus pastores, assim como católicos com padres e até bispos votaram conscientemente na proposta da violência, da discriminação e do ódio como caminho político. 

O uso do nome de Deus para legitimar o mal é antigo. Tão antigo que, na Bíblia, a primeira palavra que Deus dá quando, no monte Sinai, faz aliança com os hebreus que tinham saído da escravidão, é a ordem: “Não pronuncies o nome divino”. A tradição católica traduziu isso no mandamento: “Não usar o nome de Deus em vão”... Mas quem garante quando o uso do nome divino é em vão ou é justo?”. Durante séculos, em nome de Deus, papas, bispos, padres e pastores justificaram o direito dos impérios europeus colonizarem os povos do sul. Legitimaram guerras e crueldades humanas. Não foi somente na Idade Média que as cruzadas tinham como lema: Deus vult! Deus quer!

Atualmente, o presidente do Brasil repete como bandeira eleitoral a mesma afirmação de Hitler na Alemanha nazista:Deus acima de todos! E uma de suas ministras afirma ter visto Jesus em uma goiabeira. E tanta devoção unida a uma política contra os direitos dos mais pobres e favorável a todo tipo de preconceito só pode gerar em qualquer pessoa crítica um horror a esse deus mesquinho, cruel e discriminador. 

No tempo do nazismo, Martin Buber, espiritual judeu, afirmava: “Nenhuma palavra tem sido tão mal usada e massacrada na história do que o nome de Deus. No entanto, exatamente por isso, não podemos deixa-la assim suja e mal falada. Temos de resgatá-la e devolvê-la ao seu uso correto como expressão de amor gratuito e solidário”. 

Na fé bíblica, todos os profetas e profetizas, assim como Jesus Cristo se rebelaram contra essa forma de falar de Deus. Afirmaram que Deus é Amor e Justiça e só se deixa encontrar através do caminho da solidariedade e da defesa das pessoas e da natureza oprimida. Nessa mesma direção, em 1968, o pastor secretário geral do Conselho Mundial de Igrejas que reúne mais de 300 Igrejas evangélicas e ortodoxas, declarou: “Os cristãos que negam a sua responsabilidade social com os empobrecidos do mundo cometem pecado contra a fé tão grande quanto os que negam a ressurreição de Jesus”. Quem de fora analisa essa realidade só pode dar razão ao cineasta norte-americano Woody Allen quando afirmava: “Deus deve ser um cara bom, mas os amigos dele, eu não recomendaria”.

Paul Tillich, um dos maiores teólogos evangélicos do século XX afirmava: “O nome da profundidade e do fundo infinito, inesgotável de todo ser é Deus. Esta profundidade é o próprio sentido da palavra Deus.Se vocês virem o que há de mais importante e profundo na cultura e na vida de alguém ou de um povo, vocês estão tocando no mistério da presença de Deus”.  

 

Marcelo Barros

Camaragibe, Pernambuco, Brazil

Sou monge beneditino, chamado a trabalhar pela unidade das Igrejas e das tradições religiosas. Adoro os movimentos populares e especialmente o MST. Gosto de escrever e de me comunicar.

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