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Carta aos irmãos e irmãs, cristãos de Garanhuns

“Pouco importa a motivação, se Cristo está sendo anunciado, eu me alegro com isso” (Paulo aos filipenses 1, 18). 

Queridos irmãos e irmãs cristãos da cidade de Garanhuns, 

 Quem lhes escreve é um irmão na fé, monge beneditino e amante do evangelho. O que me move a lhes escrever é saber que um grupo que se diz cristão protesta e tenta impedir a apresentação de uma peça intitulada “O evangelho segundo Jesus, rainha do céu”. 

Não tive oportunidade ainda de ver a peça ou ao menos ler o texto. Sei que, também muitos dos que a condenam não a viram nem querem saber do seu conteúdo. A imprensa diz que o motivo da condenação é porque, na peça, Jesus é representado por uma atriz transexual. Ainda há cristãos que acham que Jesus não pode ser representado por uma transexual. 

O Jesus no qual creio se identificou com todos os que sofrem discriminações sociais e são mal vistos pela sociedade. Naquele tempo, se acreditava que as pessoas eram doentes ou sofriam porque haviam pecado. Jesus rompeu com essa crença. Solidarizou-se a tal ponto com os marginalizados e excluídos da sociedade que afirmou: “Eu tive fome e me deste de comer. Tive sede e me deste de beber. Estava nu e me vestiste,  preso e me visitaste...”. “Todas as vezes que fizestes isso a um desses pequeninos foi a mim que fizestes” (Mt 25). Aos professores da Bíblia que se julgavam mais perto de Deus, ele chegou a dizer: “Os cobradores de imposto e as prostitutas chegarão antes de vocês no reino dos céus” (Mt 21, 31). 

Assim sendo, creio que, independentemente da peça, Jesus se revela presente mais na figura da atriz transexual que transmite o amor universal que ele pregou, do que nos mantenedores de uma sociedade injusta que o papa Francisco chama do “descarte” e da indiferençapara com o outro. 

Provavelmente, outros, cristãos que leem a Bíblia de modo fundamentalista, se sentem agredidos porque ao chamar Jesus de “rainha”, a peça estaria insinuando ofensas à masculinidade de Jesus. 

Provavelmente, esses irmãos não sabem que toda a Teologia feminista atual tenta recuperar a dimensão feminina presente no Cristo. Fazem isso não para negar a masculinidade de Jesus de Nazaré, mas para reafirmar a universalidade de sua atuação, na qual homens e mulheres podem se sentir representados. Na Idade Média, místicas cristãs como Santa Catarina de Sena, Santa Hildegarda de Bingen, Santa Juliana de Norwich e outras religiosas (beguinas), falaram de Jesus como Mãe, meditaram sobre o sangue derramado na cruz como sangue menstrual e nunca nenhuma Igreja as condenou por isso. 

Sei que, no ano passado, durante meses, essa peça foi encenada na nave de uma Igreja evangélica em Curitiba e todos os que a viram saíram da experiência comovidos pela sua mensagem de amor universal. 

Parabéns para os irmãos e irmãs que enfrentam essas tensões e mantêm sua profecia evangélica. Que Deus abençoe a atriz Renata Carvalho e a autora da peça a escocesa Jo Clifford, assim como a todos/as que fazem essa produção teatral. Deus não assinou contrato de exclusividade com ninguém. A última vez que, no Brasil, alguém se colocou como proprietário de uma empresa com o nome de Jesus.comfoi o ex-deputado Eduardo Cunha que  abriu essa marca ligada à Assembleia de Deus da Madureira, RJ, para onde desviou milhões de reais. Woody Allen, diretor e ator cinematográfico, dizia: “Deus deve ser um cara bom, mas os amigos que dizem representá-lo, eu não recomendaria”.  

Queridos irmãos e irmãs, prossigam a missão de espalhar que Deus é Amor e, para nós, cristãos, Jesus Cristo é presença desse Amor que nós todos somos chamados/as a viver. 

Abraços do irmão Marcelo Barros

Marcelo Barros

Camaragibe, Pernambuco, Brazil

Sou monge beneditino, chamado a trabalhar pela unidade das Igrejas e das tradições religiosas. Adoro os movimentos populares e especialmente o MST. Gosto de escrever e de me comunicar.

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